quarta-feira, 27 de agosto de 2014

A condição indestrutível de ter sido - Helena Terra [Dublinense]

Já eram duas da manhã quando terminei de ler o livro de Helena Terra. E como se fosse combinado, lá fora e aqui dentro a tempestade se fez presente. A chuva grossa e avassaladora que caía pras bandas de lá de minha janela, também chovia em meu peito. Assim como as gotas de chuva lavavam as ruas da sujeira dos dias, as lágrimas que A condição indestrutível de ter sido provocaram em mim, lavavam meus olhos, meu rosto, minha boca e, principalmente, meu coração.

Enquanto lia o livro, sentia como se cada uma das palavras embebidas em poesia saíssem de um conta gotas direto pras minhas veias. Como uma grande catarse, Helena me transbordou. Me lavou inteira de poesia, lágrimas e a certeza de que a condição de ter sido é sempre a que mais dói, não importa por quantas vezes a ultrapassemos.

Sua narrativa é tão poética quanto tomar um café sozinha no fim da tarde, observando o pôr-do-sol. Uma narrativa introspectiva, mas que transborda. Um estar sozinho no mundo, mas com um quê de conforto. Um aroma forte da vida que grita dentro e fora de nós.

Sua personagem é muitas. São muitos estilhaços divididos entre o amor, a paixão, a fúria, o ciúme, a solidão, o medo. E toda essa avalanche de sentimentos vai sendo costurada com uma linha forte, mas doce, pela autora.

Não é uma narrativa linear, exatamente porque não conta uma história linear. Não é o café, pão, jornal, trânsito das manhãs cotidianas. Não, A condição indestrutível de ter sido é a manhã depois da noite mal dormida. É o tomar café apressado e derrubá-lo na blusa branca. É a olheira que não se esconde por trás do corretivo mais potente.

É uma história de amor que dá certo, e não dá certo. Como todas as histórias de amor desse mundo. A diferença - e eu sempre digo que essa é a diferença entre livros bons e ruins - é a forma como Helena Terra conta a história. Porque não é o que se conta, mas como se conta que importa. E esse como contar de Helena faz com que nós, leitores, nos coloquemos lado a lado com aquela moça por detrás do computador, e absorvamos suas palavras como se fossem as nossas. E choremos suas lágrimas como se fossem as nossas, até porque serão nossas, uma vez que é impossível não virar nuvem e chover durante a leitura.


Ler A condição indestrutível de ter sido foi como levar uma surra em doses homeopáticas. Uma hora vinha o soco e logo depois o suspiro de se saber ainda vivo. Helena Terra me traduziu, e eu não poderia tê-la lido em melhor hora, pois o livro veio até mim justamente quando meu coração precisava de boas doses de poesia, realidade e acalento.

A condição indestrutível de ter sido é uma leitura que dói e deixa cicatrizes, não vou mentir. Mas são essas mesmas cicatrizes que mostram o quanto somos fortes por termos sobrevivido.

Se você deve ler A condição indestrutível de ter sido? Não, você não deve ler, você PRECISA ler. Você precisa sentir na pele, e no peito, e na garganta aquele furacão de sentimentos pra modo de expurgar esses demônios aí que você vem guardando há tanto tempo.

Eu o conheci através da minha querida Juliana Gervason, do O Batom de Clarice. Quem me conhece sabe bem o quanto tenho senões com novos autores, e como leio pouca literatura feita por mulheres. E ainda bem que eu sempre tomo as indicações da Ju de olhos fechados, porque se livro fosse roupa, nesse exato momento da minha vida, A condição indestrutível de ter sido poderia ser aquilo que chamamos de "meu número", pois me caiu como uma luva.

Por último, veja alguns trechos que separei do livro, e me diga: "Tem como não se apaixonar?"...

"Sempre que fiquei sentada por horas e horas encarando o monitor e uma mensagem não veio, pedi por sua alma. Ofereci sua alma aos demônios. Os meus. Suas ausências foram a minha pior face." (p. 20)

"Iria como uma nuvem, transformei-me em nuvens. Criei pra nós um céu de palavras e o habitei com a atmosfera carregada de esperanças e de verbos. A esperança e o verbo eram o meu ar, as minhas nuvens, o meu amor. Sem eles, pouco me importa ser de carne e osso e ter ou não ter uma cabeça, tronco e membros." (p. 21)



"Ouvir, enxergar, tocar: queria ter sido escolhida por ele como um poema em uma antologia. Queria ser o poema sentado ao lado dele no cinema, no carro, em qualquer lugar." (p. 31)

"Se há esperança para recordar, você segue em frente. Se você tem alguém para compartilhá-la e andar junto, para dizer, sim, essa é a nossa trincheira, essa é a nossa tábua a mar aberto, seja de um mar salgado ou de invisibilidades, você se ultrapassa e vai além da rotina complexa de uma relação virtual [...]" (p. 63).

Referência: TERRA, Helena. A indestrutível condição de ter sido. Porto Alegre: Dublinense, 2013.

Para saber mais, visite:

Um comentário:

  1. Pati, adorei o blog. Queria dizer que, embora eu nunca tenha comentando nada, sempre acompanho seus vídeos e publicações. Adorei o projeto Machado de Assis cronológico, tanto que resolvi fazer o mesmo também.

    Obrigado e Parabéns!!!

    Um beijo.

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'Brigada por ter me dado um 'cadinho do seu tempo!
Assim que possível, respondo, viu!
Beijo procê!