quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

A menina e os outros

Numa manhã cinzenta,
tão cinzenta quanto os pensamentos mais tristes
que se possa imaginar,
andava pelas ruas molhadas
uma menina cheia de cor.
Ela sorria para os pássaros,
se encantava com os galhos secos das árvores
nuas de primavera
e cantarolava em Sol maior uma melodia de esquecimentos.
Aquela menina sabia que era preciso continuar
apesar de
apesar deles
a pesar desencantamentos poéticos na balança da vida.

Os outros
cujos passos apressados matavam formigas no caos
Os outros
cujas retinas fatigadas já não enxergam a beleza das sombras
Os outros
cujos corações cansados batiam lentamente como numa valsinha triste
Esses não entendiam por que é que aquela menina
carregava consigo um arco-íris
Não entendiam porque não sentiam.
E não há entender sem sentir.

A menina sentia.

Sentia as cores de um pôr do sol de outono
Sentia a brisa morna de uma manhã de verão
Sentia as gotas fagueiras das chuvas de março
brincando nas calhas de roda do coração

A menina entendia que o mundo era mais
do que aquilo que ela podia ver
do alto de sua meninice
Ela entendia que o mundo inteiro
cabia no abraço apertado da vó
ou no pão quentinho devorado nas manhãs preguiçosas de domingo

A menina, no alto de sua pureza,
enxergava a vida com os óculos do bem-me-quer
Enquanto os outros fugiam de si mesmos nas noites solitárias
de um boteco qualquer.

A menina um dia cresceu
e teve que esconder seu arco-íris
debaixo da pontinha do nariz
pra modo de poder se misturar com os outros
que jamais entenderiam como gente grande pode andar por aí
com mania de poesia.

Patrícia Pirota
Setembro de 2015

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

"Viver e não ter a vergonha de ser feliz..."

Companhia Musical [Clique no nome da música e veja o clipe]
O que é, o que é - Gonzaguinha
Ensaboa e Quantas Lágrimas - Marisa Monte e Pastoras da Velha Guarda da Portela [Tia Doca, Tia Surica e Tia Eunice] [Um dos vídeos mais lindos dessa vida!]
Gracias a la vida - Mercedes Sosa
Non, je ne regrette rien - Cássia Eller

Companhia Literária
"Há impossibilidade de ser além do que se é - no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio, sou mais do que eu, quase normalmente - tenho um corpo e tudo que eu fizer é continuação de meu começo. [...] A única verdade é que vivo. Sinceramente, eu vivo. Quem sou? Bem, isso já é demais...." [Clarice Lispector in A Paixão segundo G.H.]


Sabe aqueles dias em que você acorda sorrindo? Dá aqueeeela espreguiçada na cama, e ao passar pelo espelho dá aquele sorrisão largo e gostoso? E então sente o cheirinho do café quentinho saindo do coador, senta pra ver o sol, e sorri?

Mas eu não estou falando da sensação de alegria produzida por algum acontecimento bom [e nem por algum psicotrópico, que fique bem claro]. Há dias em que a gente acorda sorrindo porque recebeu uma promoção no emprego. Porque conseguiu terminar uma tarefa há muito em execução. Porque teve uma boa noite de sono. Porque teve uma boa noite de amor. Porque o filho disse a primeira palavra [embora incompreensível para os falantes de língua portuguesa, mas linda na língua dos pais]. Porque é aniversário da mãe. Não, eu falo daqueles dias em que você sorri pelo simples [e tão complexo] fato de estar vivo.

A gente vive uma vida de atleta, mesmo sem se dar conta. Como se todos os dias tivesse que correr uma maratona com barreiras. E vai, com a força máxima, pulando os obstáculos, sem olhar pros lados, ganhando medalhas. Chega à noite, deita a cabeça cansada no travesseiro, e dorme como uma pedra.

E a gente se esquece de agradecer. Seja agradecer a uma entidade, a um deus, às pessoas que estão ao nosso lado, ou a nós mesmos. A gente esquece que a vida é sim uma dádiva, um presente; talvez o melhor presente que nossos pais no deram [melhor até que aquele que você pediu ao Papai Noel no alto de sua ingenuidade infantil].

Nunca li um livro de "auto-ajuda" inteiro [Atualização de 2015: Cheguei à conclusão de que o termo autoajuda é só uma classificação editorial. A leitura, em si, é um ato de autoajuda, uma vez que estamos nos ajudando a pensar e compreender melhor o mundo.]. Não que eu os despreze. De modo algum. Acho que qualquer leitura é válida desde que enriqueça e preencha a alma daquele que a lê. Mas prefiro a ajuda das personagens de livros de ficção. Prefiro aprender a não ser desconfiada do mundo com o Bentinho. Aprender que a loucura é apenas mais uma das características de qualquer humano com o Dr. Bacamarte. Aprender que muitas vezes o homem é sujo e desprezível com o homem do subsolo de Dostoiévski.

Aquela coisa de catarse, sabe? Oi? Ah, não sabe? Então... Os gregos inventaram o teatro, a tragédia e a comédia, com a intenção de ensinar valores às pessoas. Assim, sempre que um espectador visse as características de uma personagem, ele iria se reconhecer. Se a personagem fosse má, ela teria um triste fim, para ensinar aos cidadãos que as maldades são pagas com dor e morte. E ao se reconhecer na personagem, o espectador sofreria uma catarse, um sentimento daqueles que vem lá do fundo, embrulhando nosso estômago, e acende a luzinha da nossa cachola, nos fazendo refletir.

Por que falei dos livros de auto-ajuda? Porque acredito, que eles são, na verdade, uma fonte pras pessoas lembrarem daquilo que já sabem, ou daquilo que já lhes foi ensinado. Muitos discursos presentes nesses livros saíram da boca de nossos avós, de nossos pais, ou de pessoas mais sábias do que nós.

E um desses discursos é o velho [mas não caduco] "não faça ao próximo aquilo que não gostaria que fizessem com você", que aprendi com papai e mamãe desde muito pequena, e que, se eu precisasse escolher um lema de vida, ele o seria. Discurso esse também apropriado pelos "segredos editoriais".

Me parece tão simples pensar que aquilo que eu faço será refletido. Como se o mundo fosse um espelho, que reflete aquilo que fazemos a ele. Se sorrirmos pro espelho, ele devolverá nosso sorriso, ainda mais brilhante. Se metermos a mão na cara dele, ele nos devolverá o soco em forma de dor e sangue.

E há algum tempo, eu escolhi dar ao espelho sorrisos. Sorrisos de gratidão, de alegria, de aprendizado. Deixei de reclamar ao léu, pra reclamar sobre aquilo que precisa ser mudado, e ajudar a mudar. Porque, de nada adianta fazer cara feia pro problema se você não tem uma solução pra ele. É gasto de energia à toa. Assim como deixar a torneira aberta enquanto escova os dentes. É tão melhor economizar água, como economizar descontentamento.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

E o dia seguinte, como faz?

Acorda, estrupícia!
Sabadão à noite, você sai toda trabalhada na maquiagem, no salto e no sorrisão, e lá pelas tantas, depois de só ter sobrado o sorrisão e o salto [porque ficar descalça em boteco #nempensar, estrupícia! Não importa seu estado alcoolico! Você não sabe, e emnomedejesus nem quer saber, o que já passou por aquele chão], você encontra um gatinho no meio do caminho...

Depois de umas palavrinhas, uns olhares enviesados e uns beijinhos, vocês trocam telefone e se despedem. Você vai pra casa toda sorrisinhos, lembra do cheiro dele, e dorme feito uma pedra [porque com aquela cara de panda, sinto muito, mas não dá pra te chamar de anjo, né minha filha!].

Depois de quase um dia de sono, você acorda já com a mão no celular. Nada de ligação. Você vai, assiste qualquer coisa que esteja passando na tv, lê todos os blogs do seu reader, tuíta, come porcaria e... nada.

Então você resolve dar umas voltinhas por aí, e vai tomar banho. Aí sim a maldição do telefone toca [nessa hora, pelamordedeus, não saia correndo do banheiro enrolada na toalha! Ou seu encontro vai ser com a enfermeira do hospital mais próximo!]:

- Hum... Uhum... Ah, sim... Tal hora? 'Tá bom... Beijo.

Sentiu a pseudo indiferença? Coisas da geração Cosmopolitan, meu bem... Demonstre indiferença, não seja fácil, não vá pra cama nos 10 primeiros encontros, não tome decisões, deixe que nós a tomamos por você... Coisas assim... Ou não...

Ao desligar o telefone, você daria um dedinho [as mais afortunadas makeupisticamente {senhor, que palavra horrorosa!} falando, dariam um batom MAC] pra que uma das meninas do Look do Dia ou da Oficina de Estilo viesse te ajudar a escolher a roupa.

Dez blusas e a certeza de que você nunca tem roupa arraigada em seu coração depois, você vai se encontrar com o gatinho...

- Hum... Ele me beijou logo de cara... Isso deve ser um bom sinal.
- Hum... Estamos de mãos dadas, que fofo...
- Hum... Ele tem pegada...

E então você sorriem. Beijam-se. Esquentam-se. Dão-se bom dia, e ele te deixa em casa no céu... Nessa hora, você já está pensando que encontrou o homem da sua vida. ACORDA estrupícia! Ele NÃO é o homem da sua vida! Talvez um dia ele seja, mas agora, agora, ele é só um carinha que você sabe malemá o sobrenome...

E então é chegada a hora de rememorar o caro Dante Alighieri: "Deixai toda a esperança vós que entrais", pois você acabou de entrar no inferno do dia seguinte.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

There's no place like home...

Fonte da imagem

Principalmente: O leite, 6 minutos e Naquela Mesa

Essa semana voltei a ler blogs. Uma das coisas que mais gostava de fazer antes de ter [por burra e espontânea vontade, diga-se de passagem] um milhão de aulas e provas pra fazer e corrigir...

Primeiro, coloquei a leitura do meu amado Vida Organizada em dia. Depois, descobri o incrível Muita calma nessa obra [Primeiro descobri o Instagram, e de lá fui me deliciar com o blog que, inclusive, me fez chorar um pouquinho...]. Ainda procurando inspirações sobre Decoração, visitei o Arrumadíssimo, da minha querida Isa Kastrup.

Foi quando me lembrei, com uma saudade que me abraçou mais forte que lutador de MMA, dos meus áureos tempos de blogger...

Lá em 2009, quando eu não era nem um pouco conhecida [Não que eu seja muito hoje em dia... Continuo não sendo ninguém na fila do pão, que fique claro...], eu escrevia muito. Sobre tudo. E com uma felicidade indizível de poder mostrar pra quem quisesse ver meus pensamentos sobre a vida, o Universo e tudo mais.

Foi nessa época que a fofa da Isa Kastrup me descobriu, e fez um post sobre mim [que na época ainda era a MininaMá] e meu cafofo. A partir dali, fiz amizades [entre elas, a minha querida Lidi Vasconcelos, do incrível Bicha Fêmea, que hoje é o Trololó de Mulher], melhorei minhas habilidades com as redes sociais [na época eu só usava o Twitter], criei meu canal no Youtube, me rendi ao Instagram, ao Snapchat e... parei de blogar.

Confesso que uma das coisas que me fez perder um pouquinho a vontade de blogar foi a obrigatoriedade [autoimposta, por motivos de loucura] de falar sobre livros. Como o meu canal ficou conhecido como sendo sobre livros, até hoje, em qualquer rede social, sou cobrada a falar tão e somente de livros e leituras.

Há, inclusive, gente que se sente no direito de me criticar [algumas vezes de forma pouco educada] por eu querer falar sobre qualquer outra coisa, como se eu fosse o Wikipédia ou qualquer outro site de referência.

Já há algum tempo me destituí do título de booktuber. Não faço mais parte desse grupo lindo que fala apenas da sua paixão sobre livros e que virou referência sobre Literatura pra moçada que está começando a gostar ou que já gosta de ler.

E, por gentileza, faça-me o favor de não interpretar isso como uma crítica, ok? Não estou, de forma alguma, dizendo que ser booktuber é ruim. Muito pelo contrário! Num país como o nosso, estar semanalmente no Youtube falando sobre livros, além de lindo, é um ato de coragem em ir contra o sistema emburrecedor que nos cerca por todas as mídias...

Admiro demais quem consegue [assim como minha querida amiga Tati Feltrin, a quem admiro por outras tantas coisas também; ou então a galera incrível do Cabine Literária] ter disciplina e criatividade para alimentar o canal e torná-lo uma referência. Admiro porque é um exemplo e também porque não dou conta...

Infelizmente, não consigo ficar em apenas um assunto. Essa limitação me faz mal, me trava todas as tempestades criativas e me deixa sem vontade de escrever.

E escrever é uma das únicas coisas que posso dizer que sei fazer direito nessa vida, além de dormir...

O período entre 2008 e 2012 foi o meu melhor período em escrita pro blogue. Eu falava sobre tudo, mas tudo de verdade!

Quem se aventurar a ler o antigo Patrícia Pirota, vai perceber que eu falava desde política, passando por roupa pra lavar, indo até Quadrinhos e voltando em futebol com uma pausa pras crônicas do cotidiano. Ou seja, meu blog era um reflexo do que sou, uma bagunça infinita de influências.

Depois que tentei entrar no molde "blogueira séria de Literatura", meu barquinho criativo afundou... E eu fiquei à deriva, tentando encontrar uma forma de voltar...

E é com muita alegria que conto procês que hoje eu encontrei! =D

A melhor forma de voltar a gostar de blogar é voltar a fazer exatamente o que eu fazia em 2009: escrever sobre o que me desse na telha, quando me desse na telha. A mesma coisa que farei com meu canal no Youtube, e que tenho feito com o Snapchat [@patricia.pirota].

Decididamente, não nasci pra seguir um cronograma, uma pauta, uma linha na internet... Faço isso sem problemas no trabalho, agora, aqui, na vida virtual, não consigo. Na verdade, não quero.

Eu tenho um trabalho que me consome muito. Dezenas de turmas, alunos, escolas, provas, estudos... E nele sigo um cronograma digno do Sistema GTD. Eu até tentei fazer isso na minha vida virtual, mas hoje decidi que não quero fazer desse meu espaço de compartilhamento mais um emprego.

Eu tenho emprego [e dos bons!], e a internet sempre foi meu hobbie, o lugar pra onde eu ia pra relaxar, descobrir coisas novas, aprender... Não quero mais me enganar e pensar que um dia vou conseguir fazer como a linda da Thaís Godinho, e criar um espaço sobre um assunto só, alimentá-lo, cuidar dele e através dele ganhar dinheiro.

Tem horas nessa vida em que precisamos reconhecer que há coisas que não são pra gente. E ser pró blogger não é pra mim...

Claro que quero receber presentes das marcas, ganhar uma graninha com o Adsense... Mas não vou dedicar todo o meu tempo livre [que, convenhamos, não é muito] tentando fazer algo que, no fim das contas, vai me deixar frustrada...

Por isso, você, sobrevivente deste blog mais empoeirado que a minha casa [Lá no Snap estou contanto tudo sobre a reforma do banheiro, já viu?], seja bem-vindo de volta ao caótico mundo de Patrícia Pirota.

Pode ser que amanhã tenha dois posts, um sobre decoração e um com uma crônica escrita de última hora, motivada por uma formiga no canto da mesa. Pode ser que eu fique três dias sem escrever. Pode ser que eu escreva todos os dias...

A partir de agora, tudo pode ser neste nosso samba do crioulo doido!

Cansei de tentar me enquadrar em padrões. Cansei de tentar ser uma pró blogger de sucesso. Cansei de ser etiquetada como "Blogueira disso ou daquilo". Cansei de ser sexy também, embora nunca tenha sido. =)

Agora, vou ali na minha rede nova, descansar... Que, pelo que estou vendo, a tal da criatividade resolveu voltar pra ficar e vai me dar trabalho...

Um beijo procês!

quinta-feira, 11 de junho de 2015

A medida de nossas dores.

Lá estava eu - numa segunda-feira velha de guerra, que explorava todas as suas possibilidades em ser insuportavelmente segunda-feira - com o coração partido.

Na verdade, não era bem o coração que estava partido, mas o cérebro que havia ficado meio desequilibrado por conta de uma decepção aqui, uma frustração ali.

De todo modo, não é isso o que importa, o que importa é que eu, embora vestida de verde, me encontrasse tão cinzenta por dentro. E me arrastava como se estivesse presa a grilhões tão pesados quanto o mundo que não é o de Drummond.

Foi quando vi um de meus alunos mais fofos, mais serelepes, mais sorridentes, todo tristinho, ele próprio arrastando seus mini grilhões.

Soube então que, naquela tarde, seu cachorrinho tão amado seria sacrificado. Ali, na minha frente, estavam as lágrimas e os sentimentos de um menino de 10 anos, cujo melhor amigo canino seria morto.

Ali estava a infância sendo manchada por um acontecimento irreversível, e eu e meu pseudosofrimento nos sentimentos pequeninos diante daquela dor tão singela.

Porque os adultos estão acostumados com as tantas bofetadas diárias. Dói um 'cadinho, choramingamos um pouco, enchemos o saco dos amigos, as timelines dos desconhecidos e logo estamos prontos pra outra frustração, outro coração que, de tão partido, já nem se importa mais em ser incompleto.

Agora, a dor daquela criança, tão desacostumada sequer a chorar por um tombo, era tão grande, mas tão grande, que não cabia nela e transbordava em lágrimas. Lágrimas pesadas, doídas, sinceras.

Talvez hoje minhas lágrimas não sejam mais tão sinceras. Digo isso porque às vezes penso que inventamos nosso próprio sofrimento. É, é isso mesmo que eu disse, nós inventamos nosso próprio sofrimento. Porque viver sempre feliz incomoda, não só a nós mesmos, mas aos outros, e, consequentemente, a nós mesmos de novo. Daí que esse ciclo vicioso acaba criando em nós, seres desumanos, essa necessidade de sofrer.

Não me venha dizer que você, em nenhum momentozinho desta malfadada vida, nunca inventou um sofrimento. 'Cê jura, bem?! Pense bem, meu bem...

Porque nós não conseguimos levar uma vida mais do mesmo pra sempre. Uma hora ou outra a gente inventa um terremoto qualquer só pra desopilar um pouco, chorar um pouco e depois sair por aí sorrindo à toa porque a vida, oras, a vida é bela assim mesmo, entre casas, bananeiras, laranjeiras e tudo indo devagar, igual à cidadezinha qualquer drummondiana.

No final do dia, escrevi um bilhetinho pro aluno fofo: "Vai ficar tudo bem, eu prometo! Essa tristeza aí vai passar, e vão ficar só as boas lembranças no lugar. Beijinho!". Ele leu, sorriu e voltou pro seu lugar ainda com os passos pesados de quem vai encarar a morte pela primeira vez.

Depois, fiquei com vergonha daquele meu tal coração partido lá do começo do texto. O que era mais uma decepção banal dessa tal de vida perto da perda irreparável de uma criança que ainda vê o mundo com os olhos da inocência?

Minha dor ficou tão pequena, que sumiu de vergonha. Afinal, ela não merecia morar nos meus pensamentos. Era uma dor tão boba, que despachei-a pra terra das dores bobocas, que inventamos pra fingir que estamos vivos.

Mas não é muito melhor estarmos vivos sem precisarmos ter pena de nós mesmos? Estarmos vivos porque sim, temos uma vida boa, casa, comida, roupa lavada e emprego pra bater o ponto todo dia? Estarmos vivos porque podemos encontrar amor em nós mesmos e ao nosso redor a todo momento? Estarmos vivos porque a vida, sem mistificações, nos basta? Estarmos vivos porque, aleluia!, o mundo está cheio de possibilidades?

Essa vida besta mesmo, meu deus, mas tão nossa, com nossas próprias pedras, que vão ficando pelo caminho, se as deixarmos... Essa vida aí, que te faz olhar pela janela e sorrir só porque daqui a pouco você vai encontrar alguém, ou a si mesmo, pra sorrir junto. Essa vida que nos faz ter esperança, por menor e mais boba que seja. Essa vida que é bonita, e é bonita e é bonita porque é nossa, tão absurdamente nossa.

E posso te contar uma coisa? Não é que, no final das contas, até eu acreditei no meu próprio recado? ;)

Patrícia Pirota
Outubro de 2013

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Antes de você chegar.

A hora teima em não passar enquanto ainda estou juntando as migalhas que você me deixou.
Parece que todo o colorido dos meus dias está se esvaindo em palavras,
e cinza
e pó.
Não quero mais tentar entender.
Até porque, isso não faria diferença nenhuma pra você.
Posso até buscar nas árvores aquele coração que um dia a gente desenhou.
Posso até sentar num banquinho e esperar seu amor voltar.
Mas não quero mais insistir em tantos sonhos.
Prefiro andar pelas calçadas, sujas de tristeza e desassossego.
Resolvo correr pela chuva, que lava meus ódios esquecidos.
Enquanto isso,
você deve estar sentindo que não faço falta.
Pensando que talvez tenha sido melhor
que seu delete tenha caído sobre minha lembrança.
Não quero mais ouvir sua voz terna,
sentir seu cheiro doce
e sorrir com suas mãos acariciando meus cabelos.
Vou buscar a paz que deixei esquecida num canto de mim.
Entre notas de silêncio e dor,
num lugar estranho deixado por alguém que eu era
antes de você chegar,
e destruir todos os castelos,
e sequestrar todas as princesas,
e me deixar continuar a dormir...

Patrícia Pirota
Outono de 2006

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Todo palhaço coloca um fim no carnaval...

Arte de Luluyse
Ela levantou num dia como outro qualquer, se olhou no espelho, sorriu seu melhor sorriso, percebeu o quanto a natureza tinha sido delicada em talhar seus traços, e foi fazer qualquer coisa que não vem ao caso nessa história. O que vem ao caso é que, como naqueles filmes americanos em que a mocinha tropeça e o mocinho a salva de cair, ela esbarrou nele.

Bonito, bonito ele não era, mas tinha um quê de amor. Porque o amor não escolhe belezas, ele simplesmente se esconde nelas, e espera que nós o encontremos num olhar, num suspiro, numa meia luz de um bar qualquer. E foi num piscar de olhos nessa meia luz que ela reconheceu o amor.

Há uma história de um velho escritor controverso, famoso mas não muito benquisto pela academia, na qual ele fala sobre um ponto luminoso sobre os ombros [ou seria nas orelhas?!] da suposta cara metade. Não pergunte porque esta narradora estúpida se lembrou dessa história agora, muito menos de onde tirei coragem em citar algo deste cidadão.

De qualquer forma, era como se ela tivesse visto nele aquele ponto luminoso. Era como se aquele, até então, completo estranho, tivesse se tornado sua alma gêmea a partir daquele momento.

E eles sorriram, e riram, se tocaram e se sentiram por dias que pareceram anos [ou seriam anos que pareceram dias?], até quando um deles resolveu se afastar.

Como acontece em toda boa história de amor, todo carnaval tem seu fim...

Anos depois eles se reencontraram. Tornaram-se amigos, ao menos, tentaram uma amizade possível depois de tantos sentimentos compartilhados. Só que ela continuava vendo o tal ponto luminoso, e, apesar de todos os avisos de "Pare já com isso!", se pensou forte o suficiente para encarar uma nova tentativa.

Afinal de contas, Vinicius já cantou tantas e tantas vezes que a vida só se dá pra quem se deu. Qual era o problema em tentar novamente? Quem sabe ela, enfim, teria a vida dada em suas mãos?

Foram meses e meses de beijos, camas, bons dias e sorrisos, não necessariamente nessa mesma ordem. Como se o Carnaval tivesse se estendido fora de época.

Um belo dia ele queria conversar. E você e eu sabemos bem que essa história de "Quero conversar" é sempre caixão e vela preta, não sabemos?  Pois bem, não era assim, tão radical, mas ele estava inseguro, não sabia se queria relacionamento sério, se era hora de namorar, essas coisas todas que seriam normais em um adolescente, mas não em um homem de 40 anos.

Ah, eu não havia dito a idade deles, não é? Pois muito bem, foi de propósito. Quero que, agora, você imagine um homem de 40 anos e uma mulher de quase 40 [mas com alma, corpo e coração de 20] tendo um caso assim, indeterminado, elíptico. Amigos, confidentes, amantes, mas não namorados. Ele não queria namorar.

Ele aparecia, de repente, num Sábado qualquer, e ela, sempre com os olhos no ponto luminoso, não conseguia dizer não. Só mais essa vez, ela tentava convencer a si mesma. Dessa vez vai dar certo, ela pedia, com as mãos elevadas, ao Deus que existia dentro de si mesma.

E então, numa segunda-feira qualquer, ela acordou com um peso nos ombros, com aquela sensação de não pertencer a esse mundo, como se algo tivesse se quebrado e ela não soubesse o quê nem como. Quando abriu a tal da rede social semeadora de discórdia, se deparou com um "Em um relacionamento sério". Mas péra, não era com ela! Como assim não era com ela?! Ele estava com ela até dois dias atrás! Ele a havia apresentado pros amigos, e dito "nossa casa"! Ele... Ele estava namorando, e não era com a nossa mocinha.

Ela, então, transformou toda aquela dor em lágrimas, e chorou não pela perda dele, mas pela perda de si mesma. Todos os sonhos, os planos, os sorrisos futuros e planejados haviam se acabado ali, no número final do Palhaço da vez, num aviso de status de uma rede social.

Ele poderia ter deixado claro que, veja bem, era só físico. Que, veja bem, a gente não deve fazer planos porque eu não quero planos com você. Que, veja bem, meu bem, eu não sou homem pra você e você não é mulher pra mim. Mas não, ele preferiu se esconder numa personagem a se mostrar, a mostrar pra ela o que realmente queria, ou não queria.

E naquela segunda-feira fria ela chorava por não ter visto. Visto os sinais, as atitudes, os avisos do Universo. Mas, Dona Mocinha da nossa história, não dava pra ver tudo isso, modiquê você estava olhando pro ponto luminoso. E aquele tal de ponto luminoso neon/fluorescente/odiaboaquatro da tal cara metade cega a gente, viu! Você desejava tanto que aquele ponto luminoso fosse de verdade, que acabou se esquecendo de olhar ao redor, e ver que era apenas o reflexo do amor que você carregava no seu coração.

Não pense que isso faz de você uma boba, não! Isso acontece com todo mundo que se deu. O que o Poetinha esqueceu de explicar é que nem sempre a vida se dá da melhor forma possível, ao menos, não da forma como a gente queria que ela se desse.

Olha, Mocinha, se eu pudesse te dar um conselho, pediria licença pra outra mocinha, do Elizabethtown, e te diria o seguinte:

"Abrace a tristeza por cinco minutos. Encare-a. Beije-a. E a esqueça. Cinco minutos. E prossiga"

Essa tristeza aí precisa ser vivida, afinal de contas, são pedaços de você que foram despedaçados. Agora, quanto ao palhaço lá, deixe que dele a vida cuida. Que ele seja feliz, se conseguir. Que ele nunca mais cruze seu caminho. E que se cruzar, você, em vez do tal ponto luminoso, veja um aviso bem grande de ALERTA na testa de palhaço dele.

E não deixe de continuar se dando, se permitindo, mesmo que todas as tristezas do mundo caim de seus olhos e que você tenha medo. Vamos combinar assim: eu te dou a mão, e a gente pula junto! Se cairmos, ao menos teremos companhia.

Ah, eu não te contei? A Mocinha é amiga da narradora. É... E olha, sorte deste tal palhaço que a narradora é uma invenção, pois, do contrário, iria botar fogo no circo e mandar o palhaço pros quintos dos infernos. Mas ó, nem vale a pena sentir ódio, porque isso faz mal pro coração.

E em vez de terminar esse texto, vou deixar umas reticências bem bonitonas aqui. Sabe por que, Mocinha? Porque quero vir depois e contar a história de que você foi feliz para sempre. Quero poder contar pra esses leitores curiosos daqui que você voltou a sorrir e largou mão dessa história de ponto luminoso [Afinal, uma coisa inventada por aquela criatura da Sociedade Alternativa só poderia ser furada!]. Quero dizer que única luz que você percebe agora é essa dentro de você, que ilumina seu caminho e a protege do escuro do medo.

Esse medo aí, que você está sentindo agora, de nunca mais ser capaz de se dar. E ó, eu venho cá dar outro conselho do seu Vinicius: o amor só é bom se doer. E essa dor não é pelo outro não, viu! É por você mesma! Porque o amor, esse tal de amor, é mais nosso que do outro. O outro poderia ser qualquer outro [o trapezista, o malabarista, o vendedor de pipocas], mas esse amor só pode ser seu. Mesmo que doa, guarde-o com carinho, modiquê é ele que vai fazer esse seu sorriso lindo voltar a brilhar.

E deixemos o Carnaval pra fevereiro. Enquanto isso, vivamos essa festa animada, surpreendente, doida e doída que é a vida! Que tal?

Ah! Já ia me esquecendo das
...

[Ps: Essa é uma história inspirada em uma história real. Não é minha, por isso não citei nomes. Mas poderia ser minha. Poderia ser a sua. A da sua amiga. Poderia ser de qualquer uma de nós. Por isso, se você encontrar um Palhaço desses por aí, atropele {ou esquarteje} sem dó, afinal, a gente nunca sabe quando ele vai querer colocar um fim no seu Carnaval. ;)]

Patrícia Pirota
Agosto de 2013

sexta-feira, 10 de abril de 2015

De todas as formas...

De todas as formas

De todas as formas indizíveis [e dizíveis]
eu disse o quanto gostava de você.
Abri a porta da minha vida,
e com delicadeza pedi pra você entrar.
Você não quis,
ficou parado na soleira
enquanto um vendaval me arrebentava o peito.
Logo eu,
que não queria ser a última romântica,
dei-te a flor mais bela do meu jardim.
Tão bobo dizer isso agora...
Agora que você mostrou
que pra você sou só mais uma pra coleção de lembranças...
Queria ter você ao meu lado,
mas você não teve coragem,
não pagou pra ver.
Agora ficamos assim:
Você aí, fora.
Eu cá, dentro.
Eu não saio.
Você não entra.
E meu amor vai minguando cada dia um pouco mais...
Vou ali fazer café.
Se quiser, entra
A porta continua aberta
Mas não demora,
que logo vem o vento da desesperança
e fecha.
A porta e o meu coração.

Patrícia Pirota
Num desses invernos da alma de 2000 e tantos...

segunda-feira, 6 de abril de 2015

III - Sobre a brevidade da vida [Sêneca]

Essa é a carta III do livro Sobre a brevidade da vida, de Sêneca, traduzido por Lúcia Sá Rebello e publicado pela Editora L&PM Pocket.

Prefiro não estragar seu diálogo com Sêneca com minhas palavras. Ouça-o e absorva... Use seu tempo de forma prazerosa. Carpe diem! ;)

*******
1. Nenhum homem sábio deixará de se espantar com a cegueira do espírito humano. Ninguém permite que sua propriedade seja invadida, e, havendo discórdias quanto aos limites, por menor que seja, os homens pegam em pedras e armas. No entanto, permitem que outros invadam suas vidas de tal modo que eles próprios conduzem seus invasores a isso. Não se encontra ninguém que queira dividir sua riqueza, mas a vida é distribuída entre muitos! São econômicos na preservação do seu patrimônio, mas desperdiçam o tempo, a única coisa que justificaria a avareza.

2. Agradar-me-ia questionar qualquer um dentre os mais velhos: "Vemos que já atingiste o fim da vida, tens cem ou mais anos. Vamos, faz o cálculo da tua existência. Conta quanto deste tempo foi tirado por um credor, uma amante, pelo poder, por um cliente. Quanto tempo foi tirado pelas brigas conjugais e por aquelas com escravos, pelo dever das idas e vindas pela cidade. Acrescenta ainda as doenças causadas por nossas próprias mãos e também todo o tempo desperdiçado. Verás que tens menos anos do que contas.

3. Prescruta a tua memória: quando atingiste um objetivo? Quantas vezes o dia transcorreu como o planejado? Quando usaste teu tempo contigo mesmo? Quando mantiveste uma boa aparência, o espírito tranquilo? Quantas obras fizeste para ti com um tempo tão longo? Quantos não esbanjaram a tua vida sem que notasses o que estavas perdendo? O quanto de tua existência não foi retirado pelos sofrimentos sem necessidade, tolos contentamentos, paixões ávidas, conversas inúteis, e quão pouco te restou do que era teu? Compreenderás que morrer cedo".

4. O que está em causa então? Viveste como se fosses viver para sempre, nunca te ocorreu a tua fragilidade. Não te dás conta de quanto tempo já transcorreu. Como se fosse pleno e abundante, o desperdiças e, nesse ínterim, o tempo que dedicas a alguém ou a alguma coisa talvez seja o teu último dia. Temes todas as coisas como os mortais, desejas tantas outras, tal qual os imortais.

5. Ouvirás a maioria dizendo: "Aos cinquenta anos me dedicarei ao ócio[17]. Aos sessenta anos, ficarei livre de todos os meus encargos". Que certeza tens de que há uma vida tão longa? O que garante que as coisas se darão como dispões? Não te envergonhas de destinar para ti somente resquícios da vida e reservar para a meditação apenas a idade que já não é produtiva? Não é tarde demais para começar a viver, quando já é tempo de desistir de fazê-lo? Que tolice dos mortais a de adiar para o quinquagésimo e sexagésimo anos as sábias decisões e, a partir daí, onde poucos chegaram, mostrar desejo de começar a viver?

[17]. Sêneca adverte contra aquela correria desvairada a que se entrega a maioria dos homens, que agem como animais, reiniciando sem cessar o mesmo movimento vão. Ora, essa inútil agitação não conduz senão ao esgotamento das forças físicas e à frustração mental. Ele não prega a preguiça, conforma afirma: "(...) não te convido à preguiça e nem à inércia" (XVIII, 2), apenas recomenda evitar a falsa operosidade e a fútil agitação.

Referência: SÊNECA, Lúcio Anneo. Tradução Lúcia Sá Rebello. Sobre a brevidade da vida. Porto Alegre: L&PM, 2008 p. 30-32

sábado, 4 de abril de 2015

Cinza

Minha poesia parou no muro.
No cinza da poluição.
No cinza da tristeza.
No cinza do suor.

Meu desalento pegou carona.
No cinza de teus olhos.
No cinza de um céu que chora.
No cinza de minhas mãos.

Meus amores foram-se embora
No cinza trem de uma estação qualquer.
Na cinza hora de um dia qualquer.
Na cinza desesperança de um coração qualquer.

Patrícia Pirota
Algum dia cinza de 2006

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Sobre amor-próprio, perfeição, Cinderela e Outono...

Às vezes, se estivermos atentos, a vida nos ensina lições através de acontecimentos pequenos, mas que, juntos, formam quebra-cabeças valiosos... E foi exatamente o que me aconteceu nos últimos dias.

Você deve estar se perguntando o que diabos tem a ver o título desse post... Dá cá a mão que te explico.

Dia desses, recebi de uma pessoa muito querida essa fofura de imagem do Snoopy que está no início do post. E depois de nossa conversa, fiquei dias pensando no quanto duvidamos no nosso próprio valor. No quanto precisamos ser valorizados pelo outro, mas nos esquecemos de valorizar a nós mesmos. No quão pouco amor-próprio nos resta depois de darmos todo o amor que temos para nossos desejos.

Na mesma semana, fui assistir ao novo filme da Cinderela com duas amigas queridas. Uma de nossas conversas se baseava no quão difícil seria encarar a realidade depois daquele conto de fadas tão lindo.

Uns dias depois, me deparei com essa imagem da Carrie [minha Drama Queen favorita], e comecei a me questionar sobre o nosso medo de não sermos perfeitos o suficiente para o outro.

E então veio o Outono, minha estação favorita, e que sempre me faz refletir [e voltar a escrever no blog]...

Nos cobramos tanto, nos preocupamos tanto com a perfeição, com ser o máximo que podemos ser, que acabamos nos esquecendo de apreciar quem somos e o que temos...

Não que eu queira defender uma atitude conformista diante da vida. Do tipo "Ah! Deixa eu me conformar com o que tem pra hoje, que 'tá bom.". Péra lá que não é assim... Eu só questiono essa nossa humana mania de sempre achar que pode ser melhor, e esquecer de que já é bom o suficiente.

Tudo bem querer uma casa melhor, um emprego mais bem remunerado, um namorado bonito, um corpo bacana, um cabelo de propaganda de xampu. Querer é bom, nos motiva, nos faz continuar lutando.

O problema é quando esse querer nos impede de ver e valorizar a quantidade de coisas boas que já temos. O ruim é quando nossos desejos nublam nossa visão a ponto de não nos deixarem apreciar aquilo que já conquistamos...

Se eu passar a vida pensando no quanto o futuro pode ser maravilhoso, ou então com saudades do passado, vou perder um presente que pode ser construído, e, mais do que isso, amado.

Ao nos olharmos no espelho [seja o de vidro, seja o da alma], sempre procuramos pelos defeitos. É raro que apreciemos o quanto nossos olhos são brilhantes, o quanto nossa boca tem um formato bonito, o quão gentis e criativos somos. Em vez disso, franzimos a testa ao ver aquela ruguinha tomando forma, odiamos nossa preguiça, ficamos bravos com aquela parte do cabelo que insiste em não parar no lugar, achamos que não somos inteligentes o bastante.

Não acho que precisemos fechar os olhos para os defeitos, mas sim que precisamos olhar pra nossa vida com olhos mais gentis.

Sua namorada pode não ter o corpo de Panicat e o rosto da Angelina Jolie, mas ela sorri pra você como se você fosse a pessoa mais especial do mundo todo; ela faz carinho nos seus cabelos com doçura; ela apoia até suas atitudes mais bobas e ri das suas piadas mais sem graça.

Seu namorado pode não ter os olhos e o sorriso do príncipe encantado da Cinderela, mas quando ele te abraça o mundo inteiro fica mais bonito; ele te faz rir até das coisas mais bobas; ele te apoia mesmo quando você está no máximo da TPM e diz que você é bonita, não importa o tamanho do seu jeans.

Você pode não ser tão inteligente quanto o Hawkings, ou tão empreendedor quanto o Jobs, ou tão talentoso quanto a Meryl Streep, ou tão engraçado quanto o Marcelo Adnet, ou tão [insira aqui uma característica que você aprecie] quanto [insira aqui uma pessoa que possua essa característica], mas você está aí, vivo, saudável, rodeado de coisas e pessoas que são importantes e especiais pra você.

Pare, por um minuto, pra pensar no quanto você já batalhou pra estar onde está.

Aprecie a vista do seu reino, das coisas que você conquistou, das pessoas que iluminam seus dias.


Não está contente com o que tem ou o lugar aonde chegou? 'Bora fazer alguma coisa pra mudar isso, mas sem esquecer que você é, SIM, bom o suficiente!

Não se esqueça de que você está rodeado de pessoas que estão ao seu lado não pelo que você será um dia, mas pelo que você é agora. Aprenda a gostar de quem você é, a acreditar que você é capaz e a apreciar aqueles que estão ao seu lado.

Não é porque não tenho aquela bendita cintura da Cinderela, nem a fada madrinha mais legal do universo e nem o príncipe mais lindo da história dos filmes dos contos de fadas que irei achar que só tendo tudo isso poderei ser feliz.

Eu tenho aquilo de que necessito e sou o resultado daquilo que faço. E se eu não tenho mais ou não sou mais, paciência. Se isso incomoda, preciso mudar, mas antes, preciso saber o porquê incomoda.

Será que incomoda só porque é o que não tenho? Será que incomoda porque o mundo diz que devo me incomodar? Ou será que incomoda porque não sou capaz de enxergar?

Não deixe de ter orgulho do que é, daqueles que estão ao seu lado e do que você tem.

Não se desespere porque não é perfeito. Ninguém é e nunca será perfeito! Cinderela é linda, tem uma cintura do tamanho de um biscoito globo, um príncipe delícia, mas é órfã. Assim como o Batman, o cara mais rico, gostoso e inteligente de Gothan City.

Os contos de fadas deveriam nos mostrar que, apesar das dificuldades, é possível ser feliz, e não que só podemos ser felizes se formos lindos, rycos e famosos e ainda tivermos em nossa cama o príncipe mais gato da paróquia.

Por isso gosto tanto do Outono...

Apesar de as folhas caírem, as árvores continuam orgulhosas daquilo que produziram. Elas não se deixam dobrar pelos ventos, e não derramam lágrimas pelas flores que já cumpriram seu papel. Pelo contrário, elas continuam fazendo seu trabalho, orgulhosas do que são, e esperando pelas novas flores, que iniciarão novos ciclos.

Assim é nossa vida, um constante ciclo de perder para ganhar... Um infinito recomeço...

Basta que tenhamos coragem o suficiente para seguir em frente, e gentileza o suficiente para apreciar os presentes que temos nas mãos...

"Have courage and be kind", dizia a mãe da Cinderela. E eu digo o mesmo para todos nós: sejamos corajosos o bastante para mudar o que não nos faz bem, e gentis o suficiente para apreciar o que somos.

[Observação: todas as imagens foram retiradas do Pinterest]

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Sobre lâmpadas e coisas qualquer coisa

Anteontem, a lâmpada do meu quarto queimou. Ela não se apagou apenas; fez um barulho, um estalo e despediu-se dessa vida para ir pra onde quer que a alma das lâmpadas [ou lâmpidas, pra ficar com mais cara de Adoniran] vão.

Daí que fui procurar uma lâmpada pra colocar no lugar, e a única que estava disposta a trabalhar conseguia ser mais fraca que a luminária que tenho no criado-mudo. Mas né, vai essa mesma, porque a janela do meu quarto é pequena pra diabo, e a luz que vem de fora não dá pra quase nada.

Fonte da imagem
A lâmpada 'tá ali, na dela, me quebrando um galho, pra modo de meus pés e minha canela não saírem lépidos pelo quarto se encontrando com cama, mesa, cadeiras e outros móveis com comportamento violento.

Mas eu não gosto dessa lâmpada. Agora mesmo, enquanto escrevo esse texto, ela está me deixando irritada.Vejo essa luz fraca, com seu jeito qualquer coisa de ser, e, mesmo sabendo que ela está fazendo sua parte, ela não me convence.

E daí que na semana que passou eu estava mesmo pensando sobre as qualquer coisas que nós aceitamos em nossas vidas, e que vão ficando, e ficando pelo simples fato de, ninguém sabe por que, terem chegado ali. Às vezes pra quebrar um galho, às vezes porque era o que tinha pra ontem.

E ao olhar pra essa maldita lâmpada, eu me lembro de quantas coisas qualquer coisa eu já deixei irem ficando em minha vida, apenas pra não ter o trabalho de procurar algo que as substituísse. Ou pra evitar a fadiga de procurar, procurar, achar que achei o certo e, no fim das contas, perceber que vou ter que procurar de novo, porque aquele não serviu.

Quantas roupas eu já comprei pensando em ajustar uns dois dedinhos. Quantos sapatos já vieram morar no meu armário porque eu pensei que, depois de um certo tempo de uso, eles iriam lacear. Quantos livros eu já comprei só porque eu precisava comprar um livro, e o que eu queria não estava disponível na hora, então resolvi pegar qualquer um, só pra preencher o vazio, só pra matar a vontade.

Já faz algum tempo que tenho evitado esse tipo de comportamento. Um bom tempo, na verdade. Tento não achar substitutos mais fáceis, rápidos e cômodos pra colocar no lugar de outra coisa que queria tanto, mas que hoje não tem, quem sabe amanhã?

Não são raros os dias em que reclamamos de que algo nos falta, até porque, somos todos uma falta infinita. E é isso que nos move, nos impele a continuar buscando. Mas hoje, perto dos meus 3.0, penso que há certas coisas que não compensam ser caçadas. Ou mesmo substituídas por outras mais cômodas, mais prateleira de baixo...

Sim, do meu torto modo, tento falar de amor. Há muito que parei de procurá-lo em cada esquina, em cada olhar. Há muito que tenho me contentado com esse vazio, que às vezes vem em forma de fome insaciável. Há muito que espero que ele venha por si só, sem que eu tenha que ir atrás dele.

Tenho me contentado com todos os outros amores que me alimentam, e, em sua maioria, eles não são qualquer coisa. Meus amigos, meus livros, minhas músicas, meu trabalho, meu rock'n roll de fim de semana. Eles são o que me impede de buscar uma lâmpada menos potente pra colocar no lugar daquela que há muito se queimou.

Não é a mesma coisa, mas ao mesmo tempo não é qualquer coisa. É um quebra-cabeça no qual sempre há de faltar uma peça, mas uma peça que não dá pra achar em qualquer lojinha de 1,99. Um peça que não dá pra trocar por outra, porque o resultado nunca será o mesmo, e é capaz de a peça estragar com todo o resto do desenho.

Engraçado é que percebo os olhos de "por que ela está há tanto tempo sozinha?". Ninguém fala, mas todo mundo se pergunta. E pra falar a verdade, eu também me pergunto, mas não falo. Penso que prefiro ficar assim, com essa peça faltando, até o dia em que, num baú escondido, eu vá achar aquela que vai encaixar certinho no vazio da figura.

Não vou promover mutirões, como também não vou abrir caixa por caixa atrás dela. Muito menos aceitar uma peça qualquer coisa, só pra dizer Olha! Consegui! Também tenho uma peça pra chamar de minha!

Quando se trata de amor, lâmpadas e quebra-cabeças não aceito nada menos do que o necessário.

É por isso que vou terminar esse texto sem sentido agora, e ir até o mercado comprar uma lâmpada. Porque, depois que eu me acostumar com essa meia-luz, com essa escuridão disfarçada, vai ser difícil ter coragem de procurar a lâmpada ideal de novo.

Patrícia Pirota
Janeiro de 2012

Voltamos com a programação anormal deste muquifo.

Fonte da imagem
Oi, tudo bem com você?

Lembra de mim? Uma doida que costumava escrever por aqui? Pois muito bem, voltei!

'Bora recomeçar... De novo e de novo, quantas vezes forem necessárias.

Não vou fazer como no blog antigo, e ficar lamuriando minha falta de tempo, responsabilidade e etc etc... Não vou me justificar pela ausência, nem dizer que... Ah, deixa pra lá, vai!

Só vim dizer que este muquifo voltará com sua programação anormal. E que ficarei imensamente feliz com sua companhia.

É isso. Espero que você esteja muito, muito bem!

Um beijo procê!