segunda-feira, 17 de novembro de 2014

O que acontece no meio - Martha Medeiros

Essa crônica faz parte do último livro de Martha Medeiros, o A graça da coisa. É uma das minhas preferidas, tanto por me lembrar que estou nesse tal de "meio" aí, e que tenho desperdiçado chances incontáveis de ser mais feliz do que sou. Espero que você goste, e que, assim como eu, aprenda que não podemos passar pela vida à toa, do contrário, isso que chamamos de meio, vai ser sempre um fim.

O que acontece no meio

Vida é o que existe entre o nascimento e a morte. O que acontece no meio é o que importa.

No meio, a gente descobre que sexo sem amor também vale a pena, mas é ginástica, não tem transcendência nenhuma. Que tudo o que faz você voltar para casa de mãos abanando (sem uma emoção, um conhecimento, uma surpresa, uma paz, uma ideia) foi perda de tempo. Que a primeira metade da vida é muito boa, mas da metade para o fim pode ser ainda melhor, se a gente aprendeu alguma coisa com os tropeços lá do início. Que o pensamento é uma aventura sem igual. Que é preciso abrir a nossa caixa-preta de vez em quando, apesar do medo do que vamos encontrar lá dentro. Que maduro é aquele que mata no peito as vertigens e os espantos.

No meio a gente descobre que sofremos mais com as coisas que imaginamos que estejam acontecendo do que com as que acontecem de fato. Que amar é lapidação, e não destruição. Que certos riscos compensam - o difícil é saber previamente quais. Que subir na vida é algo para se fazer sem pressa. Que é preciso dar uma colher de chá para o acaso. Que tudo que é muito rápido pode ser bem frustrante. Que Veneza, Mykonos, Bali e Patagônia são lugares excitantes, mas que incrível mesmo é se sentir feliz dentro da própria casa. Que a vontade é quase sempre mais forte que a razão. Quase? Ora, é sempre mais forte.

No meio, a gente descobre que reconhecer um problema é o primeiro passo para resolvê-lo. Que é muito narcisista ficar se consumindo consigo próprio. Que todas as escolhas geram dúvida - todas. Que depois de lutar pelo direito de ser diferente, chega a bendita hora de se permitir a indiferença. Que adultos se divertem mais do que os adolescentes. Que uma perda, qualquer perda, é um aperitivo da morte - mas não é a morte, que essa só acontece no fim, e ainda estamos falando do meio.

No meio, a gente descobre que precisa guardar a senha não apenas do cartão do banco, mas a senha que nos revela a nós mesmos. Que passar pela vida à toa é um desperdício imperdoável. Que as mesmas coisas que nos exibem também nos escondem (escrever, por exemplo). Que tocar na dor do outro exige delicadeza. Que ser feliz pode ser uma decisão, não apenas uma contingência. Que não é preciso se estressar tanto em busca do orgasmo, há outras coisas que também levam ao clímax: um poema, um gol, um show, um beijo.

No meio, a gente descobre que fazer a coisa certa é sempre um ato revolucionário. Que é mais produtivo agir do que reagir. Que a vida não oferece opção: ou você segue, ou você segue. Que a pior maneira de avaliar a si mesmo é se comparando com os demais. Que a verdadeira paz é aquela que nasce da verdade. E que harmonizar o que pensamos, sentimos e fazemos é um desafio que nos leva toda uma vida, esse meio todo.

04 de dezembro de 2011.

Fonte: MEDEIROS, Martha. A graça da coisa. Porto Alegre: L&PM, 2013 p. 47-48

PS: Os grifos no textos são meus, e não da autora.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Ler, viver e amar em Los Angeles [Pseudo resenha para um pseudo romance]



ESSE TEXTO CONTÉM SPOILERS!
E contém linguagem inapropriada para menores de 18 anos.

[Eu avisei que o texto é cheio de Spoilers, não avisei? Pois bem, continue por sua conta e risco...]

Pois bem... Um belo dia eu vi essa capa aqui do lado. Linda! E logo em seguida vi essa descrição aqui: "Uma Bridget Jones que gosta de ler. Algumas comem. A maioria faz compras. Há aquelas que fumam ou bebem. Outras ligam para o terapeuta. Dora cura a sua tristeza lendo - às vezes por dias consecutivos. Separada pela segunda vez, sua vida se resume a ficar na banheira com vinho e livros - de Tolstoi a Mark Twain, de Flaubert a Jane Austin. Best-seller e livro cult na Costa Oeste americana mostra como a boa literatura pode ser reconfortante e um chave contra os momentos mais difíceis da vida. Tudo isso tendo como cenário a luxuosa Los Angeles, suas lojas, paisagens e ruas que moram no imaginário dos amantes de cinema e dos seriados de TV." [Sinopse disponível no site da Livraria Saraiva]

E então eu li esse primeiro capítulo AQUI. Pronto! Fiquei louca pelo livro. Precisava dele desesperadamente. Até que o Submarino resolveu atender minhas preces e o colocou a dez reais mais frete grátis.

Uma das coisas que eu já deveria ter aprendido após anos como leitora, é que nunca se deve ir com muita sede ao pote, porque as chances de nos decepcionarmos são maiores. Dito e feito.

A capa realmente é linda. A contracapa é uma das mais convidativas que li em anos. A Publishers Weekly assim descreveu o livro: "Completo. Leva a pensar. Dora é o tipo de heroína imperfeita com quem os leitores facilmente vão se identificar". Assim falou o New York Post sobre o livro: "Quase chorei quando o livro acabou. É simplesmente fabuloso". O primeiro capítulo foi ótimo.

E acabou-se o que era doce.

Assim que terminei os dois primeiros capítulos, a Ju [d'O batom de Clarice, aquela linda!], fez um vídeo [que ela, infelizmente, tirou do ar!] falando sobre o livro. E então eu me perguntei se valia a pena continuar lendo. Ela disse que eu deveria, e eu não iria jogar fora dez realidades, né minha gente? E em menos de dois dias terminei de ler o bendito.

Eu costumo fazer anotações nos meus livros. Rabisco, escrevo comentários, faço desenhos, essas coisas que bibliófilos adoram #not. Só que dessa vez, eu fiz anotações com um propósito: fazer esse post! Fui sublinhando as partes que iria citar. Fazendo comparações. Caretas. A cada página lida, eu me retorcia ainda mais. A cada parágrafo lido, eu tinha mil idéias pra mil posts. Mas quis deixar aquele sentimento todo passar...

Terminei de ler o livro de Sábado pra Domingo. E hoje estou aqui pra dizer que sinto muito, mas ele não vale os 10 reais que paguei. Mas por que, estrupícia?!

Por quê?! Por quê?! Senta que lá vem história...

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Lua de Larvas - Sally Gardner [Impressão de leituras + Sorteio]

 Oi, tudo bem com você?

Quer tal ganhar o livro Lua de larvas, da Sally Gardner e mais dois marcadores e dois bottons lindos do livro?

Pra participar é fácil, fácil, estrupício!

É só preencher esse formulário aqui, e ser inscrito no canal Patrícia Pirota. Pronto! Simples e rápido!

Se o vencedor também for inscrito no blog, ganhará um presentinho surpresa. ;)

O sorteio começa hoje (29/09/2014) e será encerrado no dia 31/10/2014.



Eu divulgarei o nome do vencedor no dia 01/11/2014, através de e-mail e das redes sociais.

Qualquer dúvida, fique à vontade nos comentário!

E se você ainda não viu o vídeo sobre o livro, clica aqui ó: Lua de Larvas, Sally Gardner.

Beijo procês!
 

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Eu juro - Antonio Prata

Fonte da imagen
Eu juro
Antonio Prata

Você está passando por um momento difícil? Calma. Vai passar. Olhe, não fique assim, não, vai passar. Eu sei como dói. É horrível. Eu sei que parece que você não vai agüentar, mas agüenta. Sei que parece que vai explodir, mas não explode. Sei que dá vontade de abrir um zíper nas costas e sair do corpo porque dentro da gente, nesse momento, não é um bom lugar pra se estar. (Fernando Pessoa escreveu, num momento parecido, "hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu").

Dor é assim mesmo, arde, depois passa. Que bom. Aliás, a vida é assim: arde, depois passa. Que pena. A gente acha que não vai aguentar, mas aguenta: as dores e a vida.

Pense assim: agora tá insuportável, agora você queria abrir o zíper, sair do corpo, encarnar numa samambaia, virar um paralelepípedo ou qualquer coisa inanimada, anestesiada, silenciosa. Mas agora já passou. Agora já é dez segundos depois da frase passada. Sua dor já é dez segundos menor do que duas linhas atrás.

Você acha que não porque esperar a dor passar é como olhar um transatlântico no horizonte estando na praia. Ele parece parado, mas aí você desvia o olho, toma um picolé, lê uma revista, dá um pulo no mar e quando vai ver o barco já tá lá longe.

A sua dor agora, essa fogueira na sua barriga, esse chumbo na garganta, essa sensação de que pegaram sua traquéia e seu estômago e torceram como uma toalha molhada, isso tudo - é difícil de acreditar, eu sei - vai virar só uma memória, um pequeno ponto negro diluído num imenso mar de memórias. Levante-se daí, vá tomar um picolé, ler uma revista, dar um pulo no mar. Quando você for ver, passou.

Agora não dá mesmo pra ser feliz. É impossível. Mas quem disse que a gente deve ser feliz sempre? Isso é uma bobagem. Como cantou Vinícius: "É melhor viver do que ser feliz". Porque pra viver de verdade a gente tem que quebrar a cara. Tem que tentar e não conseguir. Achar que vai dar e ver que não deu. Querer muito e não alcançar. Ter e perder. 

Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e dizer uma coisa terrível, mas que tem que ser dita. Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e ouvir uma coisa terrível, que tem que ser ouvida. A vida é incontornável. A gente perde, leva porrada, é passado pra trás, cai. Dói, ai, eu sei como dói. Mas passa.

Tá vendo a felicidade ali na frente? Não, você não tá vendo, porque tem uma montanha de dor na frente. Continue andando. Você vai subir, vai sentir frio lá em cima, cansaço. Vai querer desistir, mas não vai desistir, porque você é forte e porque depois do topo a montanha começa a diminuir e o único jeito de deixá-la pra trás é continuar andando. Você vai ser feliz.

Tá vendo essa dor que agora samba no seu peito de salto agulha? Você ainda vai olhá-la no fundo dos olhos e rir da cara dela. Juro que tô falando a verdade. Eu não minto. Vai passar.

REFERÊNCIA: PRATA, Antonio. Adulterado. São Paulo: Moderna, 2009 p. 113-115

domingo, 7 de setembro de 2014

A saudade e o cotidiano.

A saudade e o cotidiano

Senti sua falta por dois,
três infinitos dias.
A saudade me corroeu como o arsênico
corrói o metal:
Lenta e desgraçadamente.
Depois,
depois veio a vida,
o despertador,
a água gelada na cara,
o ônibus lotado,
a janta fria,
o calor do diabo,
as contas com juros,
o trabalho acumulado,
as noites mal dormidas.
E um dia,
quando vesti aquela camiseta azul,
aquela que dormiu ao seu lado
por tantas noites seguidas,
aquela, que ficou com seu cheiro
grudado entre as linhas.
Nesse dia,
quando estava saindo do trabalho,
derretendo debaixo de um baita sol,
olhei pra minha camiseta,
e percebi que já há muitos dias você tinha me deixado.
No meio da rua,
descobri que nem a camiseta nem eu
sentíamos mais sua falta.
Estávamos, ambas, desviando das pedras
no caminho
tão ocupadas com a realidade que nos sufocava,
que nos esquecemos de que um dia,
que parecia tão distante,
você fez parte de nossas vidas.
Nos esquecemos de que um dia
você nos abraçou com o maior amor do mundo
E então os carros buzinaram ensandecidos,
e eu corri pra atravessar a rua.
E novamente te esqueci.
Porque a saudade só cresce em jardim sem cotidianos.
E o amor só cria raízes em terras sem realidades ensurdecedoras.

Patrícia Pirota [num agosto infinito de 2014]

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Noite em claro - Martha Medeiros


"Na solidão de seu apartamento, uma mulher escreve sobre a sua história numa noite de insônia. Uma história plena de relacionamentos marcados por frustrações, dor e prazer. Encorajada pelo champanhe, sem nenhuma censura, ela vai contando sua vida enquanto chove lá fora. O livro só terminará com o último pingo de chuva". [Sinopse do livro]

Noite em claro é o último romance de Martha Medeiros. Foi criado para fazer parte da Coleção 64 páginas, da L&PM Pocket, e tem, é claro, 64 páginas. Eu gostei bastante dessa proposta da L&PM [que todo mundo sabe que é a editora que mora no meu coração, né!], e o texto da Martha ficou na medida, lindo, poético e perfeito pra ler numa noite chuvosa ou não.

"Foi o maior striptease da minha vida. Não tirei luvas, meias, sutiãs. Tirei minha alma pra fora." [p. 48]

Eu o li em menos de uma tarde. Não conseguia desgrudar meus olhos das páginas, pois a cada frase a narradora parecia me descrever um pouco mais.


"Hoje meu inferno chama-se falta de paciência." [p. 42]

Essa é uma das características mais marcantes em Martha Medeiros: a capacidade de nos descrever mesmo sem saber quem somos. As personagens de Martha parecem sempre tão reais, tão "next door", que nos identificamos com elas logo no primeiro contato.

"Comi uma barra de chocolate só pra fingir que nada me importa, mas tudo me importa como nunca me importou nesta noite em que estou sozinha, tentando ficar bêbada, prestes a ser gorda, infernizada por recordações do passado e impaciente para inventar um futuro." [p. 3]

Há no livro uma capacidade de envolver o leitor a tal ponto que ele faça parte da história, embora ela não use um narrador "intrometido" e falante. O livro é a história de uma mulher vazia, que tem que comprar flores pra si mesma. Me lembrou muito a Mrs. Dalloway, de As Horas, e toda aquela amargura disfarçada em flores coloridas e festas vazias.

"Hoje meu sentimento é uma pedra. No dia dos namorados, é esta pedra que me habita." [p. 12]

O texto fala de relacionamentos, de todos os tipos. A personagem principal, que passa praticamente todo o texto sem nome, é uma mulher em busca de algo que possa lhe preencher o vazio, e que vai se relacionando com os homens errados, nas horas erradas.

"A gente se apaixona pelo que é impossível em nós." [p. 23]

Percebi uma certa influência - ou seria um reflexo? - de Caio F., especialmente no que diz respeito ao sexo. E o sexo tem um papel bastante importante na narrativa, porque faz parte da insatisfação e da satisfação da personagem.

"Todas as pessoas trazem o mesmo rosto melancólico de quem viveu tudo e não encontrou o que procurava." [p. 27]

É um texto doído, mas poético... É um texto marcado pela rotina, pelo dia-a-dia, pelas gotas da chuva que caem na janela enquanto ela conta sua história cheia de estilhaços que ficaram perdidos pelo caminho.

É um livro para se ler de um fôlego só, num dia chuvoso ou não, mas, de preferência, num dia em que você possa se permitir ficar sozinha com suas dores e suas saudades, pois elas virão lhe fazer companhia assim que a noite em claro terminar...

Aqui está o vídeo em que eu falo sobre o livro: Noite em claro

REFERÊNCIA: MEDEIROS, Martha. Noite em Claro. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2012.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Terapia da professora #1

"A maior das realizações é passar a vida fazendo o que importa. O ensino é importante."

Cena do filme "Sociedade dos poetas mortos
Quando fui escolher minha profissão (num longínquo século XX), me vi cercada por um mar de possíveis escolhas. Havia as clássicas (Medicina, Direito, Administração), as que davam dinheiro (Engenharias), as moderninhas (Jornalismo e Publicidade) e as que causavam pena na maioria das pessoas (Licenciaturas).

Minha mãe queria que eu fizesse Medicina ("Quero minha filha realizando meu sonho!"). Meu pai, Administração ("Tem que fazer o que dá dinheiro!"). Meus parentes, Engenharia ("Você é nerd!"). Eu... Bom, eu queria mesmo era ser escritora/atriz/cantora, ter uma casa no campo e plantar meus sonhos...

Poucos dias antes da inscrição do vestibular, lembrei que, desde pequenina, as pessoas mais influentes em minha vida [depois de minha família] foram meus professores. Cada um a seu modo, me ensinaram não só sobre equações, sintaxe, briófitas e velocidades médias; eles me ensinaram sobre a vida. Aquelas pessoas, em frente ao quadro, me inspiraram e me guiaram, ainda que não soubessem exatamente o tamanho de sua influência sobre mim.

Ao marcar no quadradinho de Letras - Licenciatura, eu esperava poder um dia ser tão importante pra alguém como meus mestres foram pra mim. Afinal de contas, o ensino e a aprendizagem - estejam eles dentro da sala de aula ou não - são o que move o mundo.

Mesmo sofrendo preconceito por conta de minha escolha, e vendo o quão desvalorizados eram aqueles indivíduos que tinham a bondade de compartilhar comigo o saber que adquiriram ao longo dos anos, eu resolvi que faria parte daquele seleto grupo de pessoas que ficavam em pé sobre suas mesas, e tentavam fazer com que outros pensassem além do lugar-comum.

Sim, Mr. Keating foi um dos principais responsáveis por minha escolha. Sociedade dos poetas mortos talvez seja o filme que mais assisti nessa vida. No início, pra aprender com Mr. Keating e seus discípulos. Nos últimos anos, pra não deixar de acreditar no quanto minha profissão é importante.

É muito triste ver professores se arrastando, trabalhando como quem vai pra guerra ou qualquer coisa que lhes tire a vida. Olho meus companheiros e sinto pena por não terem feito outra escolha; ou então, por não terem abandonado o barco ainda.

Reza a lenda que os professores são desvalorizados... E eu arrisco a dizer que os primeiros a desvalorizarem os professores são eles mesmos. Vejo semanalmente dezenas de colegas rezando por um feriado prolongado, pedindo que um raio caia em suas cabeças, sentados lendo um livro em voz alta como se aquilo fosse uma aula...

Eles reclamam do salário, dos alunos, da coordenação, da direção, do sistema, das provas... Reclamam como se reclamar adiantasse alguma coisa.

Sim, eu também me canso às vezes. Eu também reclamo às vezes, mas porque sou humana e não descontente...

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

A condição indestrutível de ter sido - Helena Terra [Dublinense]

Já eram duas da manhã quando terminei de ler o livro de Helena Terra. E como se fosse combinado, lá fora e aqui dentro a tempestade se fez presente. A chuva grossa e avassaladora que caía pras bandas de lá de minha janela, também chovia em meu peito. Assim como as gotas de chuva lavavam as ruas da sujeira dos dias, as lágrimas que A condição indestrutível de ter sido provocaram em mim, lavavam meus olhos, meu rosto, minha boca e, principalmente, meu coração.

Enquanto lia o livro, sentia como se cada uma das palavras embebidas em poesia saíssem de um conta gotas direto pras minhas veias. Como uma grande catarse, Helena me transbordou. Me lavou inteira de poesia, lágrimas e a certeza de que a condição de ter sido é sempre a que mais dói, não importa por quantas vezes a ultrapassemos.

Sua narrativa é tão poética quanto tomar um café sozinha no fim da tarde, observando o pôr-do-sol. Uma narrativa introspectiva, mas que transborda. Um estar sozinho no mundo, mas com um quê de conforto. Um aroma forte da vida que grita dentro e fora de nós.

Sua personagem é muitas. São muitos estilhaços divididos entre o amor, a paixão, a fúria, o ciúme, a solidão, o medo. E toda essa avalanche de sentimentos vai sendo costurada com uma linha forte, mas doce, pela autora.

Não é uma narrativa linear, exatamente porque não conta uma história linear. Não é o café, pão, jornal, trânsito das manhãs cotidianas. Não, A condição indestrutível de ter sido é a manhã depois da noite mal dormida. É o tomar café apressado e derrubá-lo na blusa branca. É a olheira que não se esconde por trás do corretivo mais potente.

É uma história de amor que dá certo, e não dá certo. Como todas as histórias de amor desse mundo. A diferença - e eu sempre digo que essa é a diferença entre livros bons e ruins - é a forma como Helena Terra conta a história. Porque não é o que se conta, mas como se conta que importa. E esse como contar de Helena faz com que nós, leitores, nos coloquemos lado a lado com aquela moça por detrás do computador, e absorvamos suas palavras como se fossem as nossas. E choremos suas lágrimas como se fossem as nossas, até porque serão nossas, uma vez que é impossível não virar nuvem e chover durante a leitura.

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Cada pedaço de mim

Cada pedaço de mim
[Patrícia Pirota - novembro/2006]

Cada pedaço de mim
sabe o inferno que é
ser sol em noites de chuva
ser cor nos cinzas dos edifícios
ser luz na escuridão das manhãs

Cada todo de ti
sabe a delícia que é
ser flor nas asas do vento
ser cristal nos olhos das fadas
ser azul no fundo do mar

Cada suspiro de nós
sabe a angústia que é
ser só na multidão dos dias
ser muito na pobreza da esquina
ser ninguém na roda da vida

Enquanto isso
os relógios se vão e vêem
aqueles que sabem o que é
apenas ser na ausência do nada.

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Escrevi esse poema há 8 anos, num pedaço de guardanapo, numa mesa de boteco.

A primeira vez que o postei na internet, foi no meu primeiro blog, o MininaMá. E quiseram os deuses que alguém tivesse a brilhante -só que ao contrário - ideia de dar os créditos para a genial Clarice Lispector.

Desde então ele vem sendo escrito em prosa, verso, em about me e toda a sorte de espaços das redes sociais.

Me entristece ver o nome de Clarice sendo tão maltratado. E, por mais que eu goste muito desse poema, ele não chega aos pés nem dos momentos menos inspiradores de dona Lispector.

De qualquer forma, o escolhi para ser o primeiro post oficial dessa minha nova fase.

No link abaixo, você pode ouvi-lo sendo declamado por HP Charles, esposo da minha querida Tatiana Feltrin, dona do canal ao qual pertence o vídeo, o Tiny Little Things.


Beijo procê!

Um novo começo...


Esse é o primeiro post de um novo blog de uma velha estrupícia blogueira. Meu terceiro blog. Reza a lenda que "third is the charm", então, cá estamos nós...

O meu mundo deu muitas voltas nos últimos anos, e no meio de muitos fins, decidi me reinventar, encarar um novo começo e voltar a ser eu mesma.

Sim, fui muito feliz sendo a MininaMá por mais de uma década, mas é chegada a hora das despedidas e da partida. O único que conseguiu e conseguirá se dividir em heterônimos é Pessoa. A nós, meros mortais, nos resta conviver com as máscaras ou nos despir delas...

E eu decidi me despir dessa, que me coube tão bem durante tantos anos... Só que agora eu quero ser a Patrícia Pirota. Just me. Only me. Deixarei a MininaMá no meu baú de lembranças mais lindas, e vezenquando vou lá, dar um beijo nela.

Com o tempo, vou trazendo pra cá alguns dos posts do Ainda MininaMá, que será desativado. Vou aproveitar a mudança para arrumar links, organizar informações, ou seja, botar ordem no muquifo.

Esse blog não será lá muito diferente dos antigos, mas espero que, aqui, os posts deixem de começar com "Eu sei, eu sumi, desculpa!"...

Agora teremos uma ordem nesse trem, e a estrupícia que vos fala se compromete a não deixar juntar muita teia de aranha por aqui, porque né... depois dá um trabalhão lascado pra limpar. ;)

Você está mais do que convidado a fazer parte desse novo espaço comigo, estrupício querido!

Muito obrigada àqueles que me acompanham há anos, e àqueles que chegaram há pouco. Sintam-se à vontade nessa nova casa, que também é de vocês.

Um beijo procês!